5 de julho de 2012

Almeida Maia ou onde nasce a energia

Publicado em "Açoriano Oriental" em 5-07-2012



Decorria o ano de 2010. Num mês de muito trabalho, a Patrícia Carreiro da Associação Escreviver convidou-me para ser membro do júri da primeira edição do concurso literário Letras em Movimento, e embora me tivessem assaltado inúmeras dúvidas, como o trabalho acumulado na secretária, acabei logo por aceitar o convite com muita honra. Honra no melhor sentido da palavra. Seria, e foi, uma experiência totalmente nova: ou seja, leria textos que ambicionavam ser livros um dia, e aquele que mais me marcasse, seria o vencedor.        

        Foi num dia de chuva, se me não falha a memória, que Bom Tempo no Canal, a conspiração da energia chegou à minha secretária mais sete ou oito outras obras que iam a concurso, e a curiosidade foi tanta que, logo recebi os textos, concentrei-me demoradamente na leitura de alguns. Mentiria se dissesse que a escolha foi fácil, mas pareceu-me que o misterioso título Bom Tempo no Canal, a conspiração da energia tinha, em termos acionais e estruturais, alguma coisa de diferente para oferecer. Como leitor exigente que sou, não me enganara.        

        Nas semanas que se seguiram, após aturadas leituras, se dúvidas houvesse, as mesmas dissiparam-se por completo. Eu tinha escolhido o texto que, na minha modesta ótica e opinião, deveria ser o vencedor. Troquei impressões via e-mail com os restantes elementos do júri, a saber a Patrícia Carreiro e o Pedro Chagas Freitas, e chegamos todos a bom porto: o vencedor estava encontrado, seria Bom Tempo no Canal, a conspiração da energia, de Almeida Maia.       

        Meses mais tarde, na entrega dos diplomas do concurso literário atrás referido, conheci o autor Almeida Maia, e, apesar das palavras que lhe foram dirigidas na altura, tomei a decisão de nunca deixar de motivar o autor a procurar um editor que apostasse no seu texto. E fi-lo porque conheço as dificuldades que por vezes jovens autores têm em editar os seus livros, mas igualmente porque desde o primeiro minuto me senti emocionalmente ligado ao livro e à história que conta. E, diga-se, com todo o mérito. E sinceramente espero que este seja o primeiro livro de muitos mais.        

        Almeida Maia é um jovem escritor adulto. Trinta e dois anos apenas. E longe da experiência de autores mais maduros, longe dos grandes centros urbanos difusores e geradores de ondas de choque estéticas e culturais, privado da energia e da intensidade de um mundo moderno que por vezes só nos chega tenuemente, Almeida Maia faz a ponte entre aquilo que é a nossa tradição literária, materializada, segundo alguns, em Vitorino Nemésio e na obra Mau Tempo no Canal, e a inovação emergente de novos autores e de novas formas de expressão.        

        E, se é verdade que vivemos num mundo massificado, que fez, ou faz, de alguns de nós estetas supérfluos e mundanos, no sentido em que estamos sempre a recorrer a produtos culturais que não nos dêem que pensar, de fácil consumo, descartáveis, surge assim legitimamente associado ao texto da Almeida Maia a incontornável função hedonista da literatura, tão legítima como a estética, tão pertinente como a pedagógica. Aliás, no melhor, Bom Tempo no Canal não pode ser visto somente como um produto de entretenimento, como igualmente objeto educativo e pedagógico. Quem se atrever a ler este livro, não pelo autor ser uma pessoa simpática, inteligente, bem disposta, empreendedora, mas porque a história deste livro trespassa a nossa experiência coletiva de leitores de livros escritos nos Açores – as seculares brumas da memória - e leva-nos a conhecer um novo estilo despontante, arejado, cinematográfico, intenso, e ao mesmo tempo arrojado e desvinculado do nosso melhor escol literário secular. Interessante, muito, é o processo de criação de personagens que o autor utilizou. Leio e recomendo a todos. Você, caro leitor, também, pois a energia agora começou. Parabéns a Almeida Maia.

1 comentário:

Paula disse...

Vou ler em breve ;)